Mais da metade da população adulta (54%) do município de Piracicaba é portadora de dor orofacial de intensidade predominantemente forte e moderada. 40% das pessoas que relataram dor orofacial sofrem com ela diariamente e 92% relata que a dor está presente há mais de seis meses. O estudo verificou maior prevalência de dor na região da cabeça (36%), seguida dos ombros (22%). Apenas 6% das pessoas que referiram dor, apontaram a dor de dente e 10%, dor na cavidade bucal, revela Marília Araújo Ruivo, autora da dissertação de Mestrado “Estudo epidemiológico de dores orofaciais e sua associação com qualidade de vida na população geral do município de Piracicaba, São Paulo”. Segundo a Academia Americana de Dor Orofacial, esta condição pode ser definida como a dor que acomete os tecidos moles e duros da cabeça, face e pescoço. O estudo foi orientado pelo professor Fausto Bérzin, da área de Anatomia, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) da Unicamp.
A pesquisa focada no município de Piracicaba avaliou 400 pessoas, sendo 200 homens e 200 mulheres na faixa etária entre 20 e 50 anos, oriundas de 68 bairros do município, por meio da aplicação de questionários. As pessoas foram aleatoriamente abordadas em seis diferentes pontos de passagem do município, estrategicamente selecionados como pontos de grande movimento populacional, entre eles: Terminal Central de Integração, Shopping Center, Camelódromo e praças da cidade.
“Essa abordagem nos permitiu obter resultados que refletem as condições da população geral do município, considerando que a pesquisa abrangeu uma proporção significativa de pessoas. Isto porque a maioria dos levantamentos epidemiológicos em dor orofacial investigam apenas pacientes de clínicas de tratamento de dor e acabam por obter resultados que não refletem a realidade da população geral”, relata.
Marília avalia o resultado da pesquisa e destaca uma elevada taxa de pessoas com dor de cabeça em comparação à prevalência de dor de dente e dor intra-oral. “O trabalho verificou uma baixa prevalência de dor na região intra-oral (6%) e dor de dente (10%), o que chama atenção quando comparado à frequência de pessoas que relataram dor de cabeça (36%). Tal fato pode estar associado às políticas públicas de saúde desenvolvidas no município para o controle e prevenção da doença cárie (principal causa da dor de origem dental) e das doenças intra-orais.
O município conta com as Unidades de Saúde da Família, onde o paciente encontra acesso ao serviço odontológico primário, com o Centro de Especialidades Odontológicas e a FOP, que fornece tratamento gratuito. Todos esses serviços são especializados no tratamento das odontalgias, que são dores de dente, e de condições como gengivite, periodontite e patologias intra-orais, responsáveis por ocasionar a dor intra-oral. Dessa forma, a população possui fácil acesso ao serviço especializado no tratamento da dor de dente e intra-oral, conta.
Por outro lado, a população tem dificuldade em encontrar um tratamento especializado para a dor de cabeça, dor articular, dor facial, que são outras condições de dor orofacial e, de acordo com o estudo, foram mais frequentemente apontadas pelas pessoas em relação à dor de dente e dor intra-oral. A pesquisa mostrou que a dor orofacial acomete pessoas de qualquer grau de escolaridade e nível econômico. Mesmo aqueles que têm melhor condição econômica e fácil acesso a especialistas têm dificuldade de encontrar tais profissionais.
“Apesar de o município contar com Unidade de Saúde da Família, Centro de Especialidades Odontologia e até com a FOP, há uma deficiência na formação teórico técnico em dor, tanto do cirurgião dentista quanto do médico, o que dificulta a realização de um correto diagnóstico e o desenvolvimento de um tratamento eficaz para esses indivíduos acometidos pela dor”, revela. A pesquisadora destaca que a comunidade sofre de uma carência de acesso ao tratamento especializado, pela falta de profissionais especializados para diagnosticar e tratar esta condição. Cabe ao cirurgião-dentista investigar a dor orofacial relatada pelo paciente , realizar um diagnóstico, planejar um tratamento adequado e, quando necessário, encaminhá-lo ao profissional mais indicado para auxiliar no diagnóstico ou dar continuidade ao tratamento interdisciplinar (fisioterapeura, fonoaudiólogo, médico e psicólogo).
Qualidade de vida – o estudo também mostrou o impacto que a dor orofacial pode causar na qualidade de vida de uma pessoa, uma vez que gera limitação de atividade física, alterações emocionais e distúrbios do sono. Mais de 90% das pessoas que estão muito insatisfeitas com a qualidade do sono são portadoras de dor orofacial, o que pode provocar efeitos negativos sobre a qualidade de vida em âmbito global, revela a pesquisa.
“Podemos concluir que é menos provável uma pessoa relatar uma boa qualidade de vida quando há presença de dor. O estudo mostra que 21% das pessoas que tem dor consideram ter uma qualidade de vida boa. Essa porcentagem duplica quando se avalia a frequência de pessoas que não tem dor (45%) e também consideram a qualidade de vida como boa. Ainda, 10% das pessoas que tem dor relataram ter qualidade de vida ruim, enquanto apenas 3% das pessoas que não tem dor consideram como ruim a qualidade de vida”, avalia.
Marília sugere que sejam desenvolvidas políticas publicas de saúde que atenda essa população que sofre com dor orofacial. Um Centro de Tratamento em Dor Orofacial auxiliaria, uma vez que há uma carência da população por serviços especializados, relata.