Dentista avalia eficácia de anestésico
Estudo conduzido na FOP analisa biocompatibilidade da articaína
- Texto: Isabel Gardenal
- Edição de Imagens: Fábio Reis
Anestésicos locais são fármacos bastante empregados no controle da dor em procedimentos clínicos nas áreas de Medicina e de Odontologia, isso porque bloqueiam os canais de sódio, o que impede o trajeto dos impulsos nervosos que seriam conduzidos ao sistema nervoso central. Dentre os anestésicos mais utilizados, estão as amidas, grupo no qual se destacam a lidocaína, bupivacaína, ropivacaína, mepivacaína, prilocaína e articaína.
A articaína, que se desponta no mercado como uma das mais novas drogas, apresenta uma boa difusão e uma rápida biotransformação. Apesar dessas características interessantes, o seu uso ainda está associado a complicações locais, como a parestesia (anestesia persistente com duração além da esperada), e a uma maior sensibilidade pós-operatória que a lidocaína. “Esses sintomas estão associados à alta concentração (4%) ao se administrar a articaína”, explicou a pesquisadora.
Sistemas de liberação como as nanocápsulas têm sido sugeridos na esperança de melhorar a disponibilidade e diminuir a toxicidade dos fármacos. Neste estudo, o uso da encapsulação em poli(ε-caprolactona), polímeros biocompatíveis e biodegradáveis, diminuiu a toxicidade da articaína em células epiteliais e aumentou a sua permeação. Com isso, demonstrou uma possível aplicação futura em anestesia tópica, segundo concluiu a dentista Camila Batista da Silva de Araujo Candido em sua tese de doutorado, defendida na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP).
A doutoranda testou no seu trabalho a citotoxicidade da articaína associada a nanocápsulas, bem como avaliou a sua eficácia anestésica em tecidos inflamados, além da sua capacidade de permeação.
A ideia era saber se uma formulação da articaína, associada à nanocápsula de poli(ɛ-caprolactona), com ou sem epinefrina (adrenalina), teria ganhos em relação à articaína sem aditivos. Na prática, todos os anestésicos apresentam uma melhor eficácia ao se associarem a um vasocontritor como a epinefrina, pois a toxicidade diminui e a duração da anestesia aumenta.
Camila escolheu esse tema com base nos trabalhos que fez envolvendo fármacos e carreadores tanto na iniciação científica como no mestrado. Sua finalidade era reduzir a toxicidade e os efeitos indesejáveis da droga, bem como melhorar a biodisponibilidade.
Seu estudo de doutorado foi orientado pela professora Maria Cristina Volpato, coorientado pela professora Michelle Franz Montan Braga Leite e contou com a colaboração do professor do Departamento de Engenharia Ambiental da Unesp-Sorocaba Leonardo Fraceto e de sua aluna Nathalie Melo.
APLICAÇÃO
De acordo com a dentista, vários autores consagrados na Anestesiologia, como Stanley Malamed, Daniel Haas e John Meechan, fizeram publicações sobre a articaína, mostrando um visível interesse da classe acadêmica neste anestésico.
Sabe-se que, graças a algumas peculiaridades na sua estrutura química (como a presença do anel tiofeno na região hidrofóbica e do grupamento éster na região hidrofílica), a articaína apresenta características como uma maior difusibilidade quando injetada e uma menor meia vida plasmática, sendo mais rapidamente eliminada.
A primeira característica garante à articaína a possibilidade de injeção infiltrativa na região posterior da mandíbula com o intuito de anestesiar os dentes desta região. Tendo a mandíbula um osso mais denso que a maxila, somente anestésicos com esse potencial de difusibilidade são efetivos quando esta técnica anestésica é adotada. Para outros anestésicos, como a lidocaína, a mepivacaína ou a prilocaína, a técnica adequada para anestesia dos mesmos dentes é a do bloqueio.
As taxas de sucesso para anestesia infiltrativa giram em torno de 95% enquanto que, para as técnicas de bloqueio, este valor cai para 80% a 85%. Esta vantagem da articaína deve ser levada em consideração e utilizada quando possível, salientou Camila.
Esse fármaco foi sintetizado em 1969 e comercializado pela primeira vez na Alemanha a partir de 1976. Para compreender a amplitude e o conhecimento sobre essa droga, a doutoranda realizou três experimentos. O primeiro procurou verificar a toxicidade da nova formulação em células epiteliais. O resultado foi que a pesquisadora notou que a articaína associada a nanocápsulas de poli(ɛ-caprolactona) apresentava menor toxicidade que a articaína sem aditivos.
O segundo experimento investigou o perfil de permeação das nanocápsulas em relação à articaína livre, através da mucosa do epitélio do esôfago de porcos (que é semelhante à mucosa oral dos humanos). A doutoranda observou um aumento do perfil de permeação da articaína em nanocápsulas comparativamente à articaína livre.
O terceiro experimento incluiu um teste da eficácia anestésica em modelo animal em meio inflamado. A articaína associada à nanocápsula não apresentou taxas de sucesso e nem duração diferente da articaína livre. Entretanto, não foi testada somente a articaína associada a carreadores.
Duas diferentes concentrações de articaína com epinefrina na concentração 1:200.000 também foram avaliadas e, como resultado, verificou-se uma concentração menor (2%) que a disponível comercialmente (4%). Mostrou ser uma boa alternativa em tecidos inflamados, ao passo que, uma menor concentração do sal anestésico, pode indicar uma menor toxicidade, sendo portanto exitoso o uso de uma menor concentração.
O principal achado do estudo de Camila foi ter observado o aumento do perfil de permeação da articaína em nanocápsulas de poli(ɛ-caprolactona) em comparação à articaína livre. “A minha tese sugeriu um novo uso desse sal anestésico”, reforçou.
ATIVIDADE
O estudo confirmou que as nanocápsulas são bons carreadores para articaína, uma vez que os testes exibiram bons parâmetros de caracterização. Esta associação foi menos tóxica que a articaína sem aditivos em células epiteliais da linhagem HaCaT (muito utilizada para testes de toxicidade), mas não foi efetiva para o controle da dor em tecido inflamado.
Mesmo sugerindo outros estudos, para que o conhecimento sobre o assunto avance, o trabalho de Camila já sinalizou que esta formulação é promissora para anestesia tópica.
Publicação
Tese: “Biocompatibilidade, perfil de permeação e eficácia anestésica de formulações de articaína associada a nanocápsulas de Poli (Epson-Caprolactona)”
Autora: Camila Batista da Silva de Araujo Candido
Orientadora: Maria Cristina Volpato
Coorientadora: Michelle Franz Montan Braga Leite
Colaboradores: Leonardo Fraceto e Nathalie Melo
Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP)
Matéria publicada no Portal da Unicamp: http://www.unicamp.br/unicamp/ju/636/dentista-avalia-eficacia-de-anestesico